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CARTA PÚBLICA DE REPÚDIO À MEDIDA PROVISÓRIA DA REFORMA DO ENSINO MÉDIO

Nós filósofos e filósofas, professores, professoras e estudantes universitários, lideranças de movimentos culturais e populares reunidos no 4° Congresso Brasileiro de Filosofia da Libertação, na Universidade Federal do ABC, na cidade de São Bernardo do Campo-SP, cumprindo nosso papel histórico de fazer críticas e proposições quanto ao que ocorre em nossa sociedade, repudiamos o golpe contra a Educação Brasileira, desfechado pelo ilegítimo governo de Michel Temer, através da modificação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei n° 9.394/96) por meio de Medida Provisória referente à Reforma do Ensino Médio, sem qualquer diálogo com a comunidade acadêmica e escolar no Brasil, assemelhada aos Atos Institucionais da última Ditadura Militar no país.

 

Do mesmo modo que aquele regime de exceção reprimiu duramente o pensamento crítico durante sua vigência, o atual Desgoverno de Michel Temer principia por golpear a educação brasileira, procurando suprimir a filosofia, a sociologia, as artes e inclusive a educação física, do Ensino Médio. Sua ponte para o futuro revela-se a cada dia uma ponte para o passado, pois faz retroceder a educação no país em mais de 30 anos. Embutida na falsa premissa da “flexibilização”, ao eliminar a obrigatoriedade desses componentes curriculares a reforma desconsidera dimensões essenciais para a formação integral dos jovens estudantes brasileiros, negando-lhes o direito ao acesso a conhecimentos fundamentais na formação básica, bem como às formas de produção das ciências e suas implicações éticas, políticas e estéticas.

 

A inclusão das disciplinas de filosofia e sociologia no Ensino Médio resultou de um longo debate no seio da sociedade brasileira, que se mobilizou desde a redemocratização do país, passando por um revés com o veto de Fernando Herinque Cardoso em 1998, retardando em 10 anos a presença dessas disciplinas no Ensino Médio, incluídas somente em 2008.

 

Por isso, retomando a Declaração de Paris para a Filosofia formulada na Jornadas Internacionais sobre "Filosofia e Democracia no Mundo", realizadas pela Unesco em 1995,



"Sublinhamos que o ensino de filosofia favorece a abertura do espírito, a responsabilidade cívica, a compreensão e a tolerância entre os indivíduos e entre os grupos,

"Reafirmamos que a educação filosófica, formando espíritos livres e reflexivos - capazes de resistir às diversas formas de propaganda, de fanatismo, de exclusão e de intolerância - contribui para a paz e prepara cada um a assumir suas responsabilidades face às grandes interrogações contemporâneas, notadamente no domínio da ética,

"Julgamos que o desenvolvimento da reflexão filosófica, no ensino e na vida cultural, contribui de maneira importante para a formação de cidadãos, no exercício de sua capacidade de julgamento, elemento fundamental de toda democracia.

 

E reafirmamos que


"O ensino de filosofia deve ser preservado ou estendido onde já existe, criado onde ainda não exista, e denominado explicitamente 'filosofia'.”

 

Consideramos também a filosofia como uma práxis libertadora que contribui para a formação crítica e humanista dos e das estudantes.

 

Além do mais, é um erro pedagógico imaginar que se possa melhor aprender matemática e português sem exercitar o raciocínio lógico e habilidades linguísticas e conceituais, que são desenvolvidas pela filosofia, pela sociologia e pelas outras disciplinas alijadas do programa obrigatório.

 

Isso causa um despreparo nos jovens brasileiros, tanto a uma adequada compreensão da realidade contemporânea do mundo e do país, quanto para o seu ingresso no ensino superior, uma vez que sua formação cultural e científica fica diminuída pela perda de conteúdos específicos de diversas áreas do conhecimento.

 

Permitir a contratação de professores, reconhecidos pelos políticos de turno como sendo de “notório saber”, revela-se um descaso com a necessária rigorosidade com a formação docente, sendo uma medida empobrecedora da qualidade de ensino, além de precarizar o trabalho docente.

 

Essa medida promove igualmente um embuste na interdisciplinaridade, pois um único professor responderá por uma área que abarcará distintos conteúdos disciplinares para os quais não possui formação nem condições profissionais adequadas.

 

Por outra parte, os milhares de professores que lecionam essas disciplinas no ensino médio serão jogados ao desemprego desprezando-se os recursos humanos existentes no país.

 

Já os estudantes das camadas populares e periféricas que trabalham no período diurno e estudam no período noturno terminarão obrigados a evadir da escola, por não terem o tempo disponível para cumprir com a nova carga horária exigida. Tal medida tende a estimular a marginalidade e a violência social. Revela-se aqui o caráter elitista e obscurantista desse Desgoverno, que nasce da violação da democracia e segue suprimindo direitos da população brasileira.

A essa Medida Provisória somam-se outros desmontes na Educação Brasileira como o projeto Escola sem partido, os cortes no financiamento da educação (redução de bolsas de estudo e de programas como Ciência sem Fronteira, PIBID, bolsas permanência, etc),

Por tudo isso, reivindicamos o diálogo amplo e democrático com a sociedade e os atores da educação, organizações sociais, movimentos populares. Conclamamos ao Congresso Nacional que rejeite essa autoritária Medida Provisória que desfigura e fragiliza a educação brasileira. A conivência dos parlamentares que defendem essas medidas de redução de direitos será punida pelas urnas em 2018.

 

Nenhum direito a menos!

 

 

São Bernardo do Campo-SP, 23 de setembro de 2016

Participantes do 4° Congresso Brasileiro de Filosofia da Libertação

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